Com a presença de autoridades brasileiras e líderes mundiais, têm início os trabalhos da COP30 em Belém — presidente Lula faz discurso histórico
Por Ronald Stresser — Abertura da Cúpula do Clima (6–7 de novembro de 2025) em Belém
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| © Ricardo Stuckert / Presidência da República |
Quando a cidade respira a umidade da Amazônia, ela também carrega antigas perguntas: quem protege a floresta quando o resto do mundo decide negociar? Hoje, com a Cúpula do Clima reunindo líderes, cientistas e movimentos sociais, a capital paraense responde com sua própria presença — elegante, urgente e, por vezes, improvisada. A abertura formal, prevista para a tarde, marca não apenas o início das plenárias, mas a chance de transformar promessa em compromisso.
Delegações e vozes — a geografia humana do encontro
Não se trata apenas de números: são rostos, sotaques e trajetórias que se cruzam no cais. A organização registra mais de cem delegações confirmadas, vindas dos cinco continentes — desde países insulares que veem seu futuro submerso até potências que buscam alinhar política e economia. Há ministros, chefes de Estado, representantes de povos originários, jovens que vieram do litoral para contar sobre a subida do mar, pesquisadores que passaram anos mapeando a perda de floresta. Cada um deles traz uma peça do grande quebra-cabeça climático.
No centro da plenária de inauguração, com o tema “Clima e Natureza, Florestas e Oceanos”, estarão discursos curtos e incisivos — cinco minutos para condensar responsabilidades, pedidos e, quando possível, compromissos mensuráveis. Do lado de fora, na Green Zone, a sociedade civil e as comunidades locais tomam o espaço com experiências, arte e relatos que lembram: as decisões aqui não são abstrações, são decisões sobre vidas.
Belém reconfigurada — a cidade que se veste para o mundo
A cidade se transformou numa espécie de recepção contínua: ruas recapeadas, praças requalificadas, a expectativa de milhares de visitantes. O Parque da Cidade foi desenhado para ser o coração da COP30 — com a Blue Zone para negociações formais e a Green Zone para o público. Mas a pressa das obras e o volume de participantes impuseram um teste de resistência — e de criatividade administrativa. Belém não apenas recebeu interlocutores: demonstrou que ainda guarda sotaques e soluções próprias.
Hospedagem: o maior contratempo — e a solução que virou símbolo
O maior contratempo para a realização do encontro foi a simples realidade das ruas: não havia leitos suficientes para acomodar o fluxo massivo de delegações, imprensa e convidados internacionais. O problema, porém, não encontrou apenas reclamação — encontrou inventividade. Nas últimas semanas, embarcações de pequeno, médio e grande porte rumaram a Belém e ancoraram no porto: dois navios de cruzeiro transformaram-se em hotéis flutuantes, embarcações da Marinha cederam espaço e outras plataformas náuticas foram adaptadas para hospedar equipes técnicas e delegações.
Até a Presidência da República optou pela locação de uma embarcação para atender o presidente e sua comitiva. No cais, a imagem diz muito: navios e lanchas, acostados lado a lado, viraram solução imediata para uma carência antiga — e, se há quem procure drama nessa improvisação, há também quem veja nela a prova de que inteligência logística pode, momentaneamente, vencer a especulação imobiliária. A cidade acolhe, por água e por engenho, o mundo que chegou para discuti-la.
Do palco à floresta — o que está em jogo
Este encontro é menos sobre fotografias oficiais e mais sobre legado. O anúncio de fundos, por si só, não resolve a equação; é preciso que os mecanismos de financiamento cheguem de fato às comunidades que protegem floresta, que as metas sejam traduzidas em ações verificáveis e que os povos tradicionais ocupem a linha de comando nas decisões que afetam seu território. O Fundo Florestas Tropicais para Sempre — lançado no almoço com lideranças — surge como promessa, mas a sua durabilidade dependerá de vigilância pública e fiscalização internacional.
Se as declarações de intenções converterem-se em políticas com prazo e orçamento, o discurso de Belém terá sido mais que uma solenidade: terá sido o ponto em que a diplomacia abraçou a realidade. Caso contrário, a cidade voltará à sua rotina, e o debate seguirá no mesmo lugar: em frases inspiradas, mas sem a tradução prática que a Amazônia pede.
As vozes locais que não cabem em sala fechada
Entre os painéis e os palcos oficiais, há outra cena que merece página inteira: lideranças indígenas que insistem na palavra “território”; ribeirinhos preocupados com barragens e navegação; coletivos culturais que interpretam a floresta em música e cordel. Essas vozes lembram que, por trás de negociações e cifras, existe um corpo social que vive o clima na pele. Para a reportagem, ouvir essas histórias foi perceber que a Amazônia não pede mais autorização para ser protagonista — pede ação concreta.
Veja o discurso do presidente Lula
Quando o mundo se reúne em Belém, cabe a todos — líderes e cidadãos — decidir se essa será uma página de virada ou apenas mais uma retórica bem filmada. A cidade, por ora, já venceu uma etapa: acolheu o debate e mostrou que é possível improvisar soluções quando o interesse público exige. Restará agora saber se a ambição será suficiente para transformar discurso em proteção duradoura.


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