Zohran Mamdani e a volubilidade da polarização: vitória no berço político de Trump mostra poder do clamor popular na Nova York das desigualdades
Por Ronald Stresser — 5 de novembro de 2025
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| O candidato à prefeitura de Nova York, Zohran Mamdani, participa de uma coletiva de imprensa com líderes sindicais em 2 de julho [David 'Dee' Delgado/Reuters] |
Essa é uma cidade onde bordas se tocam e se rasgam: arranha-céus lado a lado com vizinhanças estranguladas pelo aluguel; riqueza concentrada e serviços públicos que parecem cada vez mais distantes do cotidiano do trabalhador. A campanha de Mamdani capitalizou esse desalinho, convertendo frustrações em um projeto discursivo que prometeu, de forma direta, enfrentar a crise do custo de vida — do congelamento de aluguéis à gratuidade dos ônibus municipais, passando pelo acesso universal a creches.
Naquele palco no Brooklyn, a retórica teve rosto e memória. Mamdani contou histórias simples — de greves, de longas conversas com taxistas, de encontros com cozinheiros que trabalham de madrugada — e fez da empatia a arquitetura de sua mensagem. Foi uma política que, antes de tudo, se preocupou em reconhecer o outro: o que trabalha, o que fica sem espaço, o que precisa ser ouvido.
“Esta cidade é a sua cidade e esta democracia também é sua.” — palavra-chave repetida por Mamdani, convocando pertencimento onde havia distância.
Há, porém, um exercício de humildade que precisa acompanhar o entusiasmo simbólico: transformar promessas em gestão em uma cidade do tamanho de Nova York exige negociar orçamentos, leis locais e interesses corporativos que moldaram — ao longo de décadas — o modo como a metrópole funciona. A audácia da proposta encontra-se agora com a realidade técnica e política de uma administração municipal.
Politicamente, a vitória também expõe a volatilidade da polarização quando o clamor popular consegue se organizar e falar mais alto que as máquinas de marketing. Em plena era multipolar — tanto no campo geopolítico quanto na fragmentação da opinião pública — o resultado lembra que a polarização não é um destino irrevogável: é um processo político que pode mudar de curso quando estruturas de poder locais se realinham.
Mamdani representa uma confluência de fatores: uma geração mais jovem na liderança, o peso simbólico de ser o primeiro prefeito muçulmano e sul-asiático da cidade, e um programa que promete priorizar a vida cotidiana das pessoas que mais sentiram o aperto econômico. Se a eleição foi o gesto, a administração será o teste — e ele terá de comprovar, nas microdecisões, que a retórica traduz-se em efeitos tangíveis para motoristas de táxi, cozinheiros, mães que precisam de creche e famílias que arcam com aluguéis crescentes.
Em termos mais amplos, a noite no Brooklyn é uma página da história política americana que evidencia como centros urbanos podem virar o jogo político nacional. Essa realidade não anula os riscos de polarização — nem reduz a capacidade de atores inescrupulosos de explorar divisões —, mas demonstra que, quando o clamor popular se organiza, ele pode recolocar prioridades e reformatar narrativas.
A pergunta que agora paira sobre a administração de Mamdani é simples e ao mesmo tempo difícil: como transformar a energia de uma vitória em políticas que alterem, de fato, a vida das pessoas? A resposta dependerá de medidas pequenas, práticas e constantes — e da capacidade de negociar poder sem trair a promessa de pertencimento que soou tão forte naquela noite.
- Com informações da CNN, Reuters e agências internacionais


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