Quando o prazer e a prevenção não caminham juntos: novo estudo alerta para impacto dos anticoncepcionais na vida sexual
Por Ronald Stresser — Sulpost
É uma cena que se repete em quartos, bares e conversas sussurradas: jovens que, em busca do prazer, abrem mão do preservativo — o método mais acessível que protege tanto contra gravidez indesejada quanto contra uma série de infecções sexualmente transmissíveis. Um estudo recente da Organização Mundial da Saúde (OMS) e parceiros traz à tona um aspecto negligenciado das políticas de planejamento familiar: o impacto dos métodos contraceptivos na satisfação sexual dos usuários.
Publicado como The Sex Effect: The prevalence of sex life reasons for contraceptive discontinuation, o levantamento analisou 64 estudos com mais de 125 mil participantes e revela que aproximadamente 1 em cada 20 pessoas que interrompe o uso de anticoncepcionais enquanto ainda precisa de proteção o faz por perceber efeitos negativos em sua vida sexual.
Sexo, prazer e proteção: uma tríade que precisa conversar
“A capacidade de aproveitar o sexo sem o medo de uma gravidez não planejada é uma das principais razões pelas quais as pessoas usam contraceptivos”, afirma a Dra. Pascale Allotey, diretora da área de Saúde Sexual, Reprodutiva, Materna, Infantil, Adolescente e Envelhecimento da OMS. O estudo mostra relatos variados — desde queda de libido e desconforto durante a relação até apreensões sobre a experiência do parceiro — e nota que esses relatos aparecem entre usuárias e usuários de métodos hormonais e não hormonais.
O silêncio dos consultórios
Apesar de frequentes, esses efeitos raramente são discutidos em consultas de planejamento familiar. A conversa sobre efeitos sexuais colaterais costuma ficar fora do roteiro clínico e de pesquisas — uma lacuna que o estudo chama de atenção.
Recomendações práticas do estudo
- Normalizar conversas sobre sexo durante o aconselhamento contraceptivo.
- Integrar a aceitabilidade sexual nas diretrizes de saúde reprodutiva.
- Treinar profissionais para reconhecer e abordar efeitos sexuais adversos — e oferecer soluções práticas, como lubrificantes quando houver ressecamento.
- Incluir o bem-estar sexual na pesquisa, no planejamento e no desenvolvimento de novos produtos contraceptivos.
Impactos além do individual
Atender às necessidades contraceptivas de forma completa tem efeitos diretos na saúde pública: estimativas indicam que, se essas necessidades fossem plenamente atendidas, a mortalidade materna poderia cair entre 25% e 35%, e as gravidezes não planejadas poderiam reduzir de 80 milhões para 26 milhões por ano. Além disso, o uso consistente de métodos de barreira, como preservativos, protege contra infecções como HIV, gonorreia, clamídia e sífilis — algo que volta ao centro do debate quando jovens abrem mão da camisinha “em nome do prazer”.
Vozes que o número não conta
As estatísticas escondem histórias: de quem deixou de usar o método escolhido por sentir-se menos desejável, ao casal que interrompe a proteção por acreditar que o preservativo atrapalha a intimidade. Esses relatos mostram que contracepção e prazer não só podem, como devem, caminhar juntos.
“Garantir que a contracepção possa apoiar uma vida sexual satisfatória e segura é essencial para melhorar a saúde sexual — e, portanto, a saúde geral das pessoas.” — Dra. Lianne Gonsalves, OMS.
Para transformar essa realidade é necessário mais do que métodos: é preciso diálogo nos consultórios, pesquisas que incluam sexo e prazer como variáveis relevantes, e políticas públicas que reconheçam a intimidade como parte legítima das estratégias de saúde sexual.
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