segunda-feira, 11 de agosto de 2025

Israel mata jornalista em Gaza alegando ligação com terrorismo

Israel assassina jornalista da Al Jazeera em Gaza sob alegação de ligação com o Hamas; ONU condena atentado

Por Ronald Stresser | Sulpost

 
 

Gaza — Anas Al-Sharif (foto) sabia que estava exposto. Nas últimas semanas, o Exército israelense o havia apontado como “integrante do Hamas” em comunicados e postagens oficiais. Para ele — e para colegas que o conheciam como repórter — a acusação era uma condenação pública antecipada.

No mês passado, Al-Sharif escreveu em suas redes sociais: Reafirmo: eu, Anas Al-Sharif, sou um jornalista sem afiliações políticas. Minha única missão é relatar a verdade de onde se encontra — como ela é, sem preconceitos. E completou: Num momento em que uma fome mortal assola Gaza, falar a verdade tornou-se, aos olhos da ocupação, uma ameaça.

Essa ameaça se materializou nesta semana, quando um ataque israelense matou Al-Sharif — o último correspondente ativo da Al Jazeera no norte de Gaza. O episódio gerou fortes reações internacionais e renovou o clamor por proteção a jornalistas em zonas de conflito.

Uma campanha de difamação e o medo anunciado

Organizações de defesa da imprensa já haviam alertado para o risco. Em julho, o CPJ (Comitê para a Proteção dos Jornalistas) afirmou estar “profundamente preocupado” com a segurança de Al-Sharif e reportou que ele temia por sua vida após sofrer o que descreveu como “uma campanha de difamação militar israelense, que ele acredita ser um precursor de seu assassinato”.

Desde o início da guerra, há quase dois anos, o CPJ contabiliza 186 jornalistas mortos em ataques israelenses — um número que acentua a tensão entre proteção de civis, segurança militar e liberdade de imprensa.

A relatora especial da ONU para a liberdade de expressão, Irene Khan, disse há duas semanas estar “profundamente alarmada com as repetidas ameaças e acusações do Exército israelense contra Anas Al-Sharif, o último jornalista sobrevivente da Al Jazeera no norte de Gaza”. A ONU classificou as acusações como “ataques online e acusações infundadas”.

Contexto da guerra e da crise humanitária

A atual ofensiva começou em 7 de outubro de 2023, quando combatentes do Hamas atacaram Israel — episódio que deixou 1.200 mortos e 251 reféns naquele dia. Em reação, Israel lançou uma campanha militar massiva por terra e ar contra a Faixa de Gaza.

O resultado foi devastador: cerca de 1,9 milhão de pessoas deslocadas — mais de 80% da população de Gaza, segundo a UNRWA — e, de acordo com o Ministério da Saúde de Gaza, pelo menos 61 mil mortos. O ministério, controlado pelo Hamas, não distingue civis de combatentes em sua contagem e afirma que mais da metade das vítimas são mulheres e crianças; Israel diz que pelo menos 20 mil dos mortos são combatentes do grupo radical.

Além das mortes diretas por combates, a fome se instalou como tragédia corriqueira. A ONU informou que, desde maio, mais de mil pessoas foram mortas tentando obter alimentos, após mudanças no sistema de distribuição de suprimentos. Relatos diários descrevem casos de inanição enquanto correntes de ajuda ficam bloqueadas ou insuficientes.

O silêncio que a bala tenta impor

Para colegas e fontes, Al-Sharif era “a voz que narrava a dor cotidiana” — fotos, despertar de famílias, filas por água, crianças deslocadas. Ao apontá-lo como membro do Hamas, críticos dizem que as autoridades transformaram a reportagem em suposta atividade hostil, criando justificativas públicas para ações letais.

A Al Jazeera classificou o assassinato como “crime contra a imprensa” e sinalizou que buscará responsabilização em instâncias internacionais. A ONU e grupos de direitos humanos exigem investigação independente. Israel, por sua vez, repete que opera contra alvos vinculados ao Hamas e que considera legítimo atingir estruturas e indivíduos relacionados ao grupo.

Enquanto isso, o lugar deixado por Al-Sharif — como o de tantos jornalistas mortos ao cobrir Gaza — traduz-se numa perda dupla: a silenciada testemunha ocular e a diminuição do fluxo de informação confiável sobre uma população que vive sob cerco, fome e teto de bombas.

📍Com informações da Reuters, ONU, CPJ (Comitê para a Proteção dos Jornalistas); Al Jazeera; Ministério da Saúde de Gaza e UNRWA.

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