Grupo operava com motivação ideológica, promovia assassinatos seletivos e vendia sentenças judiciais; entre os alvos, cidadãos taxados como comunistas e corruptos, e também advogados assassinados por retaliação ou dinheiro
| Agentes comprem mandados expedidos pelo STF — Divulgação/PF |
Um grupo com nome de guerra, sedento por sangue e dinheiro — Ainda era madrugada quando os agentes da Polícia Federal bateram às portas de endereços em Mato Grosso, São Paulo e Minas Gerais. A missão: desarticular uma organização criminosa que operava como um esquadrão da morte contemporâneo, movido por ideologia e dinheiro. O grupo, que se autodenominava Comando C4 — sigla para “Comando de Caça Comunistas, Corruptos e Criminosos” —, promovia assanatos sob encomenda, espionagem e lavagem de dinheiro por meio da venda de sentenças judiciais.
A operação de hoje é a 7ª fase da Operação Sisamnes, e lança luz sobre os bastidores sombrios de um Brasil paralelo, onde decisões judiciais são negociadas nos bastidores e opositores — reais ou imaginários — podem ter a vida ceifada por valores que variam conforme a sua “importância”.
O crime que expôs os subterrâneos do poder
O ponto de virada contra esses crimes horrendos veio em dezembro de 2023, quando o advogado Roberto Zampieri foi brutalmente assassinado, com dez tiros, dentro do próprio escritório em Cuiabá. A execução chocou o meio jurídico e acendeu o alerta da PF. Ao investigar o homicídio, os investigadores descobriram uma rede profunda e assustadora: por trás do assassinato, havia um esquema sofisticado de venda de sentenças no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e um esquadrão da morte disposto a eliminar qualquer um que fosse considerado como ameaça ao seu funcionamento.
Durante a apuração, descobriu-se que o Comando C4 não era apenas um nome de fachada. O grupo operava com uma estrutura sofisticada, paramilitar, e era formado por militares da ativa e da reserva, além de civis, lobistas e empresários. O objetivo: neutralizar adversários políticos, concorrentes, delatores e até desafetos pessoais.
Execuções com tabela de preço
Os investigadores se depararam com um material macabro: uma tabela impressa com valores para assassinatos encomendados. Os preços variavam conforme a avaliação do perfil da vítima — quanto mais “perigosa” ou influente, maior o valor. O grupo também usava métodos de espionagem para rastrear os passos dos alvos, monitorar suas comunicações e garantir o sucesso das execuções.
Segundo fontes da PF, o grupo mantinha um discurso ideológico radical, tentando justificar os crimes brutais que praticava como uma forma de “limpeza moral” e “justiça patriótica”. Na prática, porém, o esquema criminoso se tratava de uma milícia de aluguel, onde ideologia e dinheiro caminhavam juntas.
Desdobramentos e prisão de envolvidos
Na operação de hoje, foram cumpridos cinco mandados de prisão preventiva, quatro de monitoramento eletrônico e seis mandados de busca e apreensão, além de medidas cautelares como recolhimento domiciliar noturno, proibição de contato entre os investigados e apreensão de passaportes. As ordens à PF partiram do Supremo Tribunal Federal (STF), em função do envolvimento de pessoas com foro privilegiado.
Entre os alvos estão advogados, chefes de gabinete, empresários e até magistrados, todos suspeitos de participar da rede criminosa que misturava homicídios, espionagem e venda de decisões judiciais. Também foram apreendidas armas de fogo, documentos sigilosos e equipamentos de comunicação criptografada.
O nome da operação e sua mensagem
Batizada de Sisamnes, a operação remete ao juiz persa do século VI a.C. que foi executado por corrupção. Seu exemplo histórico ecoa como um alerta: nem os mais poderosos estão acima da lei. A PF não descarta novas fases da operação, nem a existência de outros núcleos do Comando C4 em diferentes estados do país.
A democracia sob ameaça velada
Embora a motivação ideológica do Comando C4 pareça alinhada a discursos radicais de extrema direita, a investigação aponta para uma aliança oportunista entre fanatismo político e interesses econômicos. A venda de sentenças no STJ, a perseguição a comunistas imaginários e a execução de figuras-chave do Judiciário e da advocacia revelam uma tentativa silenciosa de capturar o Estado por dentro.
“Estamos diante de algo muito maior do que um grupo de justiceiros armados”, resume uma fonte da PF. “É uma ameaça real à democracia, às instituições e ao Estado de Direito.”
Próximas etapas
A investigação continua e novas prisões não estão descartadas. À medida que mais detalhes emergem, o país se vê diante de um cenário perturbador: há grupos dispostos a matar em nome de uma moral distorcida — gerada pela polarização política — e, pior, dispostos a pagar ou receber por isso.
Enquanto isso, o nome de Roberto Zampieri permanece como símbolo trágico de um Brasil onde até a justiça virou alvo — ou moeda de troca.
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