Gigante do Oriente e o Brasil de braços dados: Lula costura alianças com a China em meio à turbulência global
Por Ronald Stresser*![]() |
Presidente Lula e primeira-dama Janja da Silva desembarcam em Pequim - Ricardo Stuckert/PR |
Num momento em que o mundo segura a respiração diante das turbulências da geopolítica, Lula pousa em Pequim com algo que vai além de propostas — carrega esperança. É um presidente que conhece o peso da responsabilidade, mas também a força de um país que não se encolhe diante dos gigantes. Pela terceira vez, ele aperta a mão de Xi Jinping, e nesta segunda visita à China desde que voltou ao Planalto, o gesto ganha contornos maiores do que a mera diplomacia. Em meio ao clima tenso entre Pequim e a América de Donald Trump, Lula se movimenta com a destreza de quem entende o jogo — e faz do Brasil um jogador respeitado, sem abaixar a cabeça nem sair do prumo.
O momento não poderia ser mais sensível. Desde que Trump voltou à Casa Branca, a relação entre Brasília e Washington esfriou. A elevação de tarifas sobre produtos brasileiros, a ausência de diálogo direto entre os presidentes e a hostilidade do governo norte-americano ao grupo dos BRICS criaram um vácuo que Lula tenta preencher com inteligência estratégica — sem se alinhar cegamente a nenhum dos lados. “Não queremos ser quintal de ninguém”, já afirmou o presidente em visita à Rússia, num recado claro aos dois polos hegemônicos do planeta.
Sinergias em construção
Do outro lado do mundo, a China de Xi Jinping acena com oportunidades que o Brasil parece pronto para abraçar — com cautela. O plano é conectar os ambiciosos projetos da Nova Rota da Seda, lançada por Pequim em 2013, com o Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). Juntas, as iniciativas podem mobilizar bilhões de dólares em infraestrutura, conectividade, energia, indústria naval, finanças e obras de integração continental. Mas, diferente de outros países latino-americanos, o Brasil optou por não aderir formalmente à Rota da Seda — o que não impediu a criação de uma força-tarefa para avaliar, caso a caso, onde os interesses se cruzam.
Entre as propostas já em discussão, está a conclusão de corredores bioceânicos que cortam a América do Sul e podem encurtar o caminho das exportações brasileiras rumo à Ásia. Outra frente mira investimentos em metrôs, VLTs, rodovias, ferrovias e portos. Segundo o ministro da Casa Civil, Rui Costa, só os leilões de rodovias previstos para este ano podem atrair até US$ 50 bilhões.
Além de infraestrutura, a agenda inclui saúde, energia e até símbolos de diplomacia. Dois pandas, por exemplo, podem ser enviados ao Brasil como gesto de amizade — tradição chinesa reservada a poucos aliados. Também está na mesa a venda de até 20 aeronaves Embraer para operar em rotas regionais dentro da China. O acordo, travado desde 2023, ainda depende de alinhamentos finais, mas tem potencial de abrir novas avenidas para a indústria aeronáutica nacional.
Empresariado e política de mãos dadas
A comitiva brasileira em Pequim reúne nomes de peso. De multinacionais como Vale, Raízen, Eurofarma, Suzano e Weg a representantes de estatais, bancos e órgãos públicos, o encontro empresarial sino-brasileiro simboliza o esforço coletivo para transformar afinidades políticas em negócios concretos.
Nos bastidores, ministros como Simone Tebet (Planejamento), Alexandre Silveira (Minas e Energia) e Carlos Fávaro (Agricultura) articulam os detalhes dos novos acordos. Governadores e o presidente do Congresso, Davi Alcolumbre, também participam. O pano de fundo é uma visão clara: o Brasil quer — e precisa — atrair investimentos que gerem empregos, divisas e infraestrutura moderna.
Equilíbrio delicado
Mesmo com os laços estreitos com Xi, Lula evita criar a imagem de um alinhamento automático. A palavra de ordem no Itamaraty é "equilíbrio". O governo reforça que a aproximação com a China não significa oposição aos EUA — ainda que Trump, com sua retórica agressiva, insista em tratar a América Latina como quintal exclusivo.
Na diplomacia climática e no multilateralismo, porém, Brasil e China falam a mesma língua. A expectativa é que Lula e Xi façam uma defesa enfática da cooperação entre países emergentes no BRICS e da importância de mecanismos globais justos e representativos. A sintonia também se estende à guerra na Ucrânia. Lula e Xi têm tentado convencer Vladimir Putin a aceitar um cessar-fogo, por meio de uma proposta conjunta batizada de “Amorim-Wang Yi”, em referência ao ex-chanceler brasileiro e ao ministro chinês.
O Brasil que se posiciona
Entre discursos, fóruns e jantares diplomáticos, o que se desenha é um Brasil que volta a ter protagonismo. Um país que, sob a liderança de um presidente experiente, consegue transitar entre potências sem se submeter — e que aproveita a janela histórica para atrair investimentos estruturantes, com foco em soberania e desenvolvimento sustentável.
Lula talvez não precise dizer em voz alta. Mas seu gesto é eloquente: ao costurar com a China um novo capítulo da relação bilateral, ele reafirma a velha vocação brasileira para o diálogo e o pragmatismo — e mostra que, pela terceira vez, pode usar o prestígio internacional a favor de quem mais precisa: o povo brasileiro.
Nas entrelinhas de uma viagem de Estado, o que se vê é o retrato de um país que quer crescer — sem pedir licença, mas também sem pagar pau ou bater porta. Vamos que vamos!
*com informações da Agência Brasil e de agências internacionais diversas.
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