Outubro Vermelho: a poesia, o corpo e a Curitiba que vive em estado de resistência
![]() |
Um festival de dez dias que transforma Curitiba em palco — e a palavra em gesto político e afeto |
Curitiba — Quando a cidade parece prender a respiração e depois soltar um canto coletivo, é sinal de que o Outubro Vermelho chegou. O festival, com uma programação de dez dias, propõe algo raro: reunir cinema, música e poesia num mesmo sopro, para lembrar que a cultura não é distração — é resistência, memória e possibilidade.
Guta Stresser e Bertolt Brecht: teatro engajado em voz curitibana
Entre as atividades que compõem esses dias intensos, uma presença chama atenção pela força simbólica: a atriz Guta Stresser. A atriz curitibana participará do festival realizando leituras de textos e poemas de Bertolt Brecht — referência incontornável do teatro engajado.
“Quando eu recebi o convite, eu não tive dúvidas porque, para nós do teatro, a grande representação desse teatro mais engajado é o Brecht”, explica Guta.
É uma ponte entre palco e rua, entre tradição e urgência: Brecht lido hoje carrega mais do que estética — carrega perguntas sobre poder, trabalho e solidariedade. Tê-lo em voz local, pelas mãos de uma atriz que conhece a cidade, é lembrar que os clássicos também servem para debater o presente.
Programação ampla: filmes, shows e as vozes da região
Além das leituras de Brecht com Guta, o festival apresenta exibição de filmes e shows de bandas e artistas de Curitiba e da Região Metropolitana. O mapa do evento é propositalmente horizontal: espaços diversos, linguagens diferentes e um mesmo propósito — reunir público e artistas em convivência afetiva e política.
Vozes negras. Vozes populares.
Num dos encontros mais esperados do Outubro Vermelho, poetas populares ocupam um microfone público para intervenções sem teatralização forçada — performar sem se tornar espetáculo ensaiado, deixando que o corpo, a voz e o ritmo encontrem o verso como fala cotidiana. Muitos desses artistas integraram o Sarau Popular, projeto que rodou a cidade por 2 anos e meio em 65 edições, afinando uma dinâmica em que o poeta é o próprio poema.
“Popular sem ser banal, poético sem ser rebuscado. Palavra verdadeira, ato político, arte, revolução.” É esse o tom buscado: um grito suave e firme no meio do Outubro Vermelho.
Poetas convidados (seleção)
- José Domingos — nascido em 1964, no interior do Paraná; leitor de Neruda, Patativa e Drummond; voz que traz o sertão e a cidade.
- Márcio Gleide — poeta engajado, ativista cultural; mais de mil poemas e membro honorário da APB (2023).
- Moisés António — poeta e escritor nascido em Angola; autor de obras sobre identidade, memória e diáspora; lançou Eu do Outro Lado nas Terras do Além (2023).
- Maurício Santana — pesquisador, bibliotecário, guitarrista e vocalista da 5 Graus; referências em Tezza e Dostoiévski.
- Asaph Eleutério — compositor e intérprete; pesquisa sobre a cena musical independente de Curitiba.
- Sergio Viralobos — tradutor e poeta veterano; colunista cultural e presença histórica na cena literária local.
- Desi Veloso — neuropsicopedagoga e escritora; autora de contos e histórias; estuda agroecologia no IFPR.
- Paulo de Jesus — poeta e cronista curitibano; interessado em espiritualidade e questões sociais.
- Getúlio Guerra — mentor de projetos culturais e curador do Sarau Popular; autor de coletânea e articulador de periferias artísticas.
Um microfone aberto — e a entrada que o festival defende
No Restaurante NINA (Rua Marechal Deodoro, 847), a poesia será visceral: o microfone público abre espaço para que a cidade fale. O evento anunciado pelo coletivo privilegia a entrada franca e honesta — porque o acesso à cultura não pode ser privilégio. É no Nina que Guta Stresser fará sua leitura de Brecht, sexta-feira (17) às 19h00.
Serviço
Festival Outubro Vermelho
Duração: dez dias (programação completa com filmes, shows, leituras e intervenções)
- Atividade destacada: leituras de Bertolt Brecht com Guta Stresser (participação ao longo da programação)
- Sarau de Poetas Populares: Sábado, 11 — a partir das 20h — Restaurante NINA, Rua Marechal Deodoro, 847 — Centro
- Entrada: franca e honesta
O Outubro Vermelho nos lembra que a cidade é um corpo coletivo: cicatriza, celebra, reclama e se reinventa. Nas vozes que leem Brecht, nos versos que nascem como fala cotidiana, no acorde rasgado de uma banda local, nasce a possibilidade de reconhecer o outro e, juntos, construir sentidos. É um convite — para ouvir, para sentir, para agir.
Nenhum comentário:
Postar um comentário