segunda-feira, 13 de outubro de 2025

Amanhecer em Gaza: a libertação que inaugurou, por ora, a paz mais esperada

Em troca dos 20 reféns trazidos de volta a Israel, um amplo plano de cessar-fogo e libertações marca o primeiro capítulo de um acordo mediado pelos EUA

Por Ronald Stresser | 13 de outubro de 2025

O comboio que transportou prisioneiros palestinos chega a Ramallah, capital palestina da Cisjordânia ocupada - Reuters

O som que tomou as praças, os corredores dos hospitais e as salas do parlamento foi, no primeiro dia, o de abraços que pareciam não caber no corpo. Depois de 738 dias de cativeiro e de um conflito que rasgou territórios e vidas, os 20 reféns ainda vivos que se acreditava estarem em Gaza foram libertados nesta segunda-feira (13). A operação — acompanhada pela Cruz Vermelha e orquestrada no quadro de um plano de paz mediado pelos Estados Unidos — ocorreu em duas fases e trouxe consigo não apenas pessoas, mas perguntas, promessas e, finalmente, algum respiro à população exaurida das duas margens do conflito.

A entrega: dois momentos, um país em festa

Foram sete libertados no norte de Gaza no início da manhã e outros treze ao longo do dia, no sul — todos recebidos com choro, ansiedade e, sobretudo, o reencontro que parecia proibido por tanto tempo. Em Tel Aviv, a Praça dos Reféns inchou de gente; em Ramallah, ônibus cheios de prisioneiros palestinos traziam uma imagem igualmente poderosa: a de um povo que reencontra parte de sua gente após anos de separação.

A troca que redesenha um dia

A libertação não foi um ato isolado: Israel iniciou a soltura de cerca de 250 prisioneiros palestinos e de mais de 1.700 moradores de Gaza detidos durante o conflito. Ônibus chegaram a Ramallah, onde as cenas de reencontro — e de tensão — foram captadas por diferentes equipes de imprensa. Em Gaza, hospitais se preparam para receber cidadãos que retornam marcados pelo tempo atrás das grades ou pela dureza da guerra.

O kit do retorno e as palavras oficiais

Em Israel, os libertados receberam kits que incluíam roupas, um computador, um celular, um tablet — e uma nota manuscrita assinada por Benjamin e Sara Netanyahu: “Em nome de todo o povo de Israel, bem-vindos de volta!”. A mensagem, simples e humana, foi parte de um ritual de reintegração que tenta preencher lacunas que nenhum aparelho pode consertar.

Trump e a mediação: um amanhecer histórico?

O presidente americano, Donald Trump, que esteve em Israel na manhã de segunda, descreveu o episódio como “o amanhecer histórico de um novo Oriente Médio” e deixou claro o papel dos Estados Unidos como costureiros do acordo. Trump seguiu para uma cúpula no Egito com cerca de 20 líderes mundiais para consolidar a primeira fase do cessar-fogo e um plano de reconstrução e supervisão humanitária. Em Londres, o primeiro-ministro Keir Starmer anunciou também apoio financeiro emergencial para Gaza, parte de um pacote maior de assistência.

O que ficou por resolver

Nem tudo foi selado em tom festivo. O Hamas afirmou que os 28 corpos dos reféns que não sobreviveram ainda serão entregues posteriormente — uma ferida que aguarda o rito do luto e do enterro digno. Ao fundo, os números que chocam: mais de 60 mil mortos desde o início da resposta israelense à incursão de 7 de outubro de 2023, entre os quais muitas crianças e mulheres — um balanço que organizações internacionais e uma comissão da ONU descreveram com termos que não é possível ignorar.

Humanidade nas margens do conflito

Quem celebrou primeiro foram as famílias — pessoas que viveram no compasso da espera por dois anos. “Nossa luta não terminou. Ela não terminará até que o último refém seja localizado e devolvido para receber um enterro digno”, disseram familiares de alguns dos libertados em comunicado. Era uma mistura de gratidão e obrigação moral, uma lembrança de que cada vida resgatada carrega consigo o peso de todas as que não voltaram.

Em Gaza, as ruas, ainda tomadas por escombros e silêncio, ouviram pela primeira vez depois de muito tempo o som de crianças brincando — um sopro delicado que não apaga os traumas, mas anuncia a possibilidade de respiração. A reconstrução será longa: de casas, infraestrutura, memórias e instituições. O acordo prevê mecanismos de supervisão internacional para garantir que ajuda humanitária entre de forma contínua e independente, em comboios monitorados pela ONU e pela Cruz Vermelha.

O que este dia significa — e o que não resolve

Este acordo inaugura uma primeira fase — de libertações, entradas humanitárias e negociações — que poderá evoluir para um cessar-fogo mais profundo e, quem sabe, compromissos políticos duradouros. Mas a paz definitiva exigirá passos que vão além de gestos simbólicos: desarmamento, garantias de segurança, justiça para vítimas, mecanismos de reconstrução e uma vontade política internacional sustentada. Por ora, o que se celebra é a vitória da espera convertida em reencontro. Não é pouco — mas também não basta.

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