CURITIBA, JUSTIÇA E MEMÓRIA: Quando a Vara que ergueu um mito volta a ser investigada — Toffoli autoriza buscas que colocam Sergio Moro no centro de uma história que ainda não terminou
Há cidades que guardam histórias íntimas com formas e endereços. Curitiba tem a 13ª Vara Federal: salas, arquivos, mesas que testemunharam delações, prisões e decisões que mudaram destinos. Nesta semana, a Justiça voltou a olhar para aqueles corredores. O ministro do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, autorizou a Polícia Federal a realizar diligências e buscas na antiga 13ª Vara — a mesma vara que consagrou Sergio Moro como juiz e que agora figura no centro de uma investigação sobre denúncias feitas pelo ex-deputado Tony Garcia.
O que a decisão significa
A ordem de Toffoli, assinada em 6 de outubro, não é só uma autorização técnica: é a permissão para que a PF examine in loco processos, mídias e documentos que podem conter vestígios de práticas investigativas questionadas por Garcia. Em linhas diretas, o ministro rejeitou um pedido da defesa de Moro para retirar o caso do Supremo, mantendo a apuração sob jurisdição da Corte. É uma medida que coloca uma lupa sobre o passado — sobre atos que, se comprovados, redesenham não apenas a biografia de um magistrado, mas a confiança pública em instituições.
As acusações
Tony Garcia afirma ter sido coagido a gravar pessoas durante as investigações do chamado caso Banestado — gravações que, segundo ele, teriam sido orientadas por Moro como parte de uma colaboração. Garcia sustenta que existiriam “diligências investigativas clandestinas” contra autoridades com foro privilegiado, e que parte da prova documental estaria arquivada justamente na 13ª Vara. Essas alegações, por sua complexidade e por envolver um personagem que transitou entre os papéis de alvo e informante, exigem paciência do Judiciário — e, sobretudo, sensibilidade para separar memória de mito, fato de narrativa.
O contraponto de Moro
O senador Sergio Moro, que já foi juiz e hoje se projeta politicamente para além dos tribunais, nega veementemente as acusações. Em nota, sua defesa classificou as denúncias como fantasiosas e disse confiar que as diligências – finalmente autorizadas – demonstrarão a fragilidade das acusações. Em tempos de polarização, é preciso lembrar que negatória pública e investigação judicial andam em trilhos distintos: a imprensa registra, o Judiciário apura, e a história decide. 3
Por que isso importa para 2026
O fato não é apenas jurídico. Moro tem circulado no tabuleiro político com ambições eleitorais que miram 2026. Para uma candidatura que se ancora no discurso da legalidade e da técnica, investigações sobre sua atuação como juiz representam um desafio existencial: corroem narrativas, exigem explicações e podem deslocar eleitores que ainda o viam como símbolo da guerra contra a corrupção. Em outras palavras, a Justiça que ontem foi arma contra a impunidade hoje testa a legenda e a reputação do próprio ex-juiz.
Um cenário maior — diplomacia e distrações
Não por acaso, os corredores do poder respiram em várias frentes. Enquanto a cena jurídica se aquece em Curitiba, Brasília e Washington trabalham nos bastidores para marcar um encontro entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Donald John Trump — uma tentativa prática de aproximação entre governos que passaram anos em confronto. Autoridades dos dois países, inclusive o chanceler Mauro Vieira e o secretário de Estado dos EUA Marco Rubio, disseram que trabalham para agendar a reunião o mais rápido possível. É a política externa lembrando que, mesmo em meio a tempestades domésticas, o país precisa manter diplomacia e pragmatismo.
O que fica para o leitor
Há algo de humano e também de cruel neste novo capítulo: pessoas — vítimas, acusadores, magistrados e cidadãos — são arrastadas por narrativas maiores que muitos não controlam. A 13ª Vara é símbolo e também acervo; os arquivos que a PF poderá acessar guardam não apenas papéis, mas decisões que mudaram biografias. Pedimos ao leitor que leia com calma, que não transforme suspeitas em sentenças e nem absolva por impulso: a verdade judicial exige provas, prazos e uma linguagem que não cabe em manchetes. O blog Sulpost acompanhará cada passo com o cuidado e o respeito aos eleitores do senador paranaense que o tema merece.
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