Esperança retratada em chamas que não se acenderam: Brasil registra queda histórica nas queimadas no primeiro semestre de 2025
Em tempos de emergência climática, quando os olhos do mundo se voltam com angústia para cada hectare de floresta devastada, o Brasil traz um sopro de alívio. Pela primeira vez em muitos anos, o país assistiu a uma queda expressiva nas áreas queimadas durante o primeiro semestre: uma redução de 65,8% em relação ao mesmo período de 2024. Uma cifra que, mais do que estatística, é respiro — para os biomas, para as comunidades e para quem luta, diariamente, pela preservação da vida em sua forma mais ampla.
De janeiro a junho deste ano, cerca de 1 milhão de hectares foram consumidos pelo fogo no Brasil. Ainda é muito — qualquer hectare em chamas já é perda. Mas é um terço dos 3,1 milhões devastados no mesmo período do ano passado. Um dado que reacende a confiança de que, com ação coordenada e vontade política, é possível virar o jogo contra a destruição ambiental.
As informações vêm do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais (Lasa) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em parceria com o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima. Mais do que números, os dados revelam um país que começa a colher os frutos de uma política ambiental mais firme e estruturada.
Do sufoco ao alívio: a resistência dos biomas
A imagem que fica de 2024 ainda é dolorosa: a Amazônia enfrentou o maior número de queimadas em 17 anos. Agora, a floresta respondeu com vigor. A área queimada caiu 75,4%, graças a uma combinação de políticas públicas, brigadistas atuantes e ações de manejo que devolveram parte da esperança aos povos da floresta e às espécies ameaçadas.
O Pantanal, joia hídrica da América do Sul e um dos biomas mais frágeis ao fogo, surpreendeu com uma redução de 97,8% no território queimado. De mais de 600 mil hectares atingidos em 2024, o bioma sofreu este ano com pouco mais de 13 mil. O impacto positivo é sentido nas águas, nos pássaros que retornam e nos peixes que escaparam das cinzas.
Também a Mata Atlântica, historicamente pressionada por séculos de devastação, registrou queda de 69,7%, enquanto o Cerrado, berço das águas brasileiras, viu as chamas recuarem 47%.
Mas nem todos os dados são motivo de celebração. Caatinga e Pampa, biomas que costumam receber menor atenção midiática e institucional, apresentaram aumento nas áreas queimadas: 10,2% e 38,2%, respectivamente. O alerta acende para a necessidade de políticas mais equânimes que reconheçam a diversidade e a importância de todos os biomas brasileiros, sem exceção.
Quando o fogo se apaga, a política acende
Por trás da redução histórica, há estratégia. Segundo o Ministério do Meio Ambiente, o avanço só foi possível graças à intensificação de ações de enfrentamento, à ampliação do número de brigadistas — um incremento de 26%, totalizando 4.385 profissionais — e ao investimento robusto de R$ 405 milhões do Fundo Amazônia, voltado ao fortalecimento dos Corpos de Bombeiros na Amazônia Legal.
Além disso, a criação da Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo trouxe o que talvez fosse mais urgente: articulação. Governos estaduais, municipais, universidades, setor privado e comunidades passaram a trabalhar juntos, reconhecendo que enfrentar as queimadas é uma missão coletiva, que não se vence com discursos vazios nem com ações isoladas.
“Prevenir e combater os incêndios é prioridade absoluta do governo do presidente Lula”, afirma o Ministério. A frase, embora institucional, representa a mudança de tom e postura no trato com o meio ambiente. Depois de anos de desmonte e negacionismo, o Brasil volta a tentar se reerguer como guardião de seus ecossistemas.
Focos de calor: uma nação menos incendiada
O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) detectou, entre janeiro e junho de 2025, 19.277 focos de calor em todo o país — contra 35.938 no mesmo período do ano anterior. A queda de 46,4% nos focos é mais um indício de que as chamas não encontraram o mesmo espaço para se alastrar.
É claro que a luta está longe de terminar. A crise climática ainda impõe desafios diários. Secas extremas, mudanças nos regimes de chuva e o avanço da fronteira agrícola continuam pressionando os biomas. Mas o recuo das queimadas mostra que é possível enfrentar esses desafios com seriedade, ciência e compromisso.
Vozes da floresta
No coração do Xingu, a indígena Tainá Yawalapiti acompanhou com alívio a redução das queimadas em sua região. “O fogo que vem de fora não é o mesmo que usamos para cuidar da terra. O fogo que destrói é o fogo do descaso. Hoje, estamos sendo ouvidos”, disse, emocionada.
Já no Pantanal, o biólogo Marcelo Campos celebra a volta dos tuiuiús e das ariranhas, que haviam sumido após os grandes incêndios de 2020 e 2024. “Pela primeira vez em anos, não começamos julho respirando fumaça. Isso tem valor que nenhum número traduz”, afirma.
Passo adiante
A diminuição das queimadas no Brasil em 2025 não é o fim do problema. Mas é, sem dúvida, um marco. É o começo de uma nova narrativa, onde o fogo não é sinônimo de destruição inevitável, mas um lembrete de que a mudança é possível.
E ela está acontecendo — onde há floresta que renasce, onde há água que retorna, onde há gente que insiste em resistir.
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