sexta-feira, 2 de maio de 2025

Quando a cobra fumou em Berlim: a incrível jornada dos brasileiros que ajudaram a derrotar o nazismo

ESPECIAL | 80 ANOS DA VITÓRIA SOBRE O NAZISMO

Quando a cobra fumou e Berlim caiu: a coragem brasileira na guerra que libertou o mundo

Por Ronald Stresser - 2 de maio de 2025

Navio da Marinha do Brasil lança carga de profundidade - Arquivo Nacional 
 

Na manhã fria do dia 2 de maio de 1945, o silêncio sobre Berlim era mais barulhento do que os canhões. A capital nazista, até então epicentro da máquina de guerra de Hitler, estava rendida. O Exército Vermelho içava sua bandeira no alto do Reichstag. A União Soviética anunciava a queda Terceiro Heich e o mundo, enfim, respirava — não apenas aliviado, mas também exausto com a guerra mais letal da história da humanidade, que ceifou de 50 a 70 milhões de vidas humanas.

O horror da guerra mais devastadora da história começava a dar lugar à esperança. E, do outro lado do mundo, onde o céu era tropical e as praças cheiravam a café coado, uma pequena legião de brasileiros comemorava também o fim da barbárie. Eles estavam longe de casa, mas perto da vitória. Tinham vencido o medo, o frio e a dúvida. Tinham feito a cobra fumar.

Quando a guerra bateu à nossa porta

Até o início dos anos 1940, o Brasil de Getúlio Vargas caminhava em cima de um fio tênue entre o Eixo e os Aliados. A balança comercial pesava mais para a Alemanha, com quem mantínhamos um intenso “comércio compensado”. Mas a neutralidade começou a ruir quando os ventos da guerra chegaram à costa brasileira. Em 1942, o torpedeamento de 34 navios por submarinos nazistas deixou quase mil mortos e destruiu qualquer ilusão de distância segura.

Em resposta, o povo foi às ruas exigindo ação. O governo, pressionado por dentro e por fora, declarou guerra à Alemanha e à Itália no dia 31 de agosto daquele mesmo ano. A pátria que havia ficado à margem das trincheiras na Primeira Guerra agora se preparava para cruzar o Atlântico com seus próprios soldados.

A Força Expedicionária Brasileira

 
Soldados da FEB posam com seus armamentos e munição - Arquivo Nacional
 

A ideia de enviar tropas brasileiras para combater na Europa parecia absurda a muitos. Surgiu, então, um dito irônico: “É mais fácil uma cobra fumar do que o Brasil entrar na guerra”. A resposta veio rápida — e feroz. Os pracinhas, como ficaram conhecidos os soldados da Força Expedicionária Brasileira (FEB), adotaram uma cobra fumando cachimbo como emblema. E fizeram dela um símbolo de bravura.

Foram 25.334 voluntários — uma fração dos 100 mil inicialmente pretendidos — que deixaram suas famílias, profissões e vidas para combater o fascismo nas montanhas geladas da Itália. Treinados pelos Estados Unidos e incorporados ao 5º Exército norte-americano, partiram do Rio de Janeiro rumo ao front com um uniforme novo e o coração cheio de dúvidas.

As batalhas que marcaram a história

Na Itália, os brasileiros enfrentaram uma geografia hostil, a rigidez do inverno europeu e um inimigo experiente. Sua primeira grande missão foi Monte Castello. Foram quatro meses de ataques e recuos até, finalmente, em fevereiro de 1945, conquistarem o topo estratégico e simbolicamente poderoso da colina ocupada pelos alemães.

Em abril daquele ano, Montese se tornou o nome da batalha mais sangrenta travada pelos brasileiros. Foram 400 baixas entre mortos e feridos, numa luta casa a casa, com granadas e lágrimas. Mas a vitória veio, como veio também em Fornovo di Taro, onde a FEB capturou mais de 20 mil soldados da 148ª Divisão alemã — um feito que ainda hoje espanta historiadores militares.

O fim da guerra e a volta para casa

A rendição da Alemanha no dia 8 de maio de 1945 foi o ponto final do combate na Europa. Mas, para os pracinhas, o retorno ao Brasil não foi apenas físico — foi político, social e simbólico. Ao voltarem, trouxeram com eles não só medalhas e histórias, mas uma nova consciência democrática.

A experiência da guerra contribuiu para o desgaste do Estado Novo e a deposição de Getúlio Vargas ainda em 1945. Os ventos de liberdade soprados da Europa atingiram em cheio o Brasil, impulsionando a redemocratização e a modernização das Forças Armadas.

O legado que resiste ao tempo

O Brasil perdeu 465 homens na guerra e teve mais de 1.500 feridos. Em troca, libertou 50 cidades italianas, escreveu seu nome entre as nações aliadas e deixou um legado de coragem que permanece vivo, mesmo com o passar dos anos. Hoje, restam apenas 42 veteranos vivos, todos com idades entre 99 e 107 anos — testemunhas de uma época em que o mundo quase se perdeu de si mesmo.

Seus nomes estão gravados em monumentos espalhados pelo Brasil e pela Itália: no Aterro do Flamengo, no Rio; no Museu do Expedicionário, em Curitiba; nas praças de Montese e Gaggio Montano. Seus corpos, para os que não voltaram, descansam em Pistoia, sob o solo que ajudaram a libertar.

Berlim, 1945 — a lembrança que permanece

Quando os soldados soviéticos chegaram a Berlim, venceram não apenas o exército de Hitler, mas também a ideologia que alimentou o Holocausto e os campos de extermínio. A vitória sobre o nazismo não pertence a um só país. Pertence a todos os que disseram “não” à tirania, mesmo que isso significasse sair do outro lado do mundo, como fizeram os nossos pracinhas.

Oito décadas depois, enquanto a Rússia declara um cessar-fogo simbólico em memória da vitória e do sacrifício, o mundo se lembra. Lembra de um tempo em que a humanidade quase se destruiu — e de homens simples, de sotaque brasileiro, que provaram que até mesmo uma cobra pode fumar, se for pela liberdade.

"A cobra fumou. E nós vencemos!"

Essa é a história que o tempo não apaga, é a heroica história do Brasil na Segunda Grande Guerra Mundial.

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