Não é droga, é tratamento: por uma vida com menos dor Paraná garante cannabis medicinal no SUS, aliviando o sofrimento de pacientes
Ronald Stresser| Sulpost
Por trás de cada crise epiléptica, de cada espasmo involuntário e de cada laudo que dizia “não há mais o que fazer”, havia sempre um silêncio cruel. O de pais, mães e pacientes à espera de uma solução que parecia nunca chegar. Mas esse silêncio começa, aos poucos, a ser substituído por uma palavra poderosa: esperança.
O Sistema Único de Saúde (SUS) do Paraná acaba de dar um passo histórico ao regulamentar, de forma oficial, a oferta gratuita de medicamentos à base de canabidiol (CBD) para o tratamento de epilepsias refratárias. A medida, que começa a ser efetivada com cadastros abertos em julho, atende pacientes diagnosticados com síndrome de Dravet, síndrome de Lennox-Gastaut e o Complexo de Esclerose Tuberosa — todas condições neurológicas raras e altamente incapacitantes.
A iniciativa estadual segue um modelo técnico, mas acima de tudo humano, ao reconhecer o sofrimento de famílias que até então tinham que recorrer à Justiça, à importação onerosa ou à espera indefinida por medicamentos ainda estigmatizados no Brasil.
THC regulamentado: avanço sem volta
Mais do que isso, desde o início de 2025, o Paraná se destaca nacionalmente como o primeiro estado brasileiro a oferecer, na rede pública de saúde, medicamentos com associação de THC (tetrahidrocanabinol) e CBD para pacientes com espasticidade moderada a grave causada pela esclerose múltipla. A oferta é garantida pela Resolução Sesa nº 1.180/2024, com 69 pacientes já em tratamento e recebendo o medicamento por meio da rede estadual e municipal.
“Estamos unindo rigor técnico e sensibilidade para garantir acesso ao que há de mais moderno no tratamento dessas doenças. A liberação do canabidiol no SUS do Paraná representa um avanço no cuidado às pessoas que enfrentam essas síndromes com enorme impacto na qualidade de vida”, afirma o secretário de Estado da Saúde, Beto Preto.
E é, de fato, um avanço. Um passo dado com base em evidências científicas sólidas, mas também na escuta dos gritos silenciosos que ecoavam dos lares onde a dor era diária e invisível.
Ciência e sensibilidade
Deise Pontarolli, coordenadora da Assistência Farmacêutica da Secretaria da Saúde (Sesa), reforça que a medida é um marco para o SUS estadual.
“Ela oferece novas perspectivas de tratamento para pacientes que não respondiam às terapias convencionais. Nosso compromisso é garantir que o fornecimento seja feito com segurança e acompanhamento rigoroso, assegurando melhores resultados para os pacientes e suas famílias”, disse.
A nova regulamentação estabelece que o canabidiol será fornecido apenas para as indicações previstas em bula, após esgotadas todas as opções terapêuticas disponíveis pelo SUS. Isso significa que o acesso será controlado, mas garantido àqueles que realmente precisam — e não têm mais tempo a perder.
Como acessar o tratamento
O sistema da Sesa está sendo parametrizado para receber os pedidos de forma ágil e segura. A partir deste mês, os pacientes ou seus responsáveis poderão apresentar a documentação exigida diretamente nas farmácias das Regionais de Saúde ou nos municípios que integram o componente especializado e o Elenco Complementar da secretaria.
Entre os documentos necessários estão:
- Documento de identidade (RG e CPF)
- Cartão nacional de saúde (SUS)
- Comprovante de residência
- Prescrição médica específica, geralmente de um neurologista
- Relatório médico detalhado
- Escalas de avaliação (quando aplicável)
- Termo de esclarecimento e responsabilidade
No caso dos medicamentos que contêm THC, o protocolo é mais rigoroso, como exige a Anvisa. A receita médica deve ser do tipo “B” (azul) para concentrações de até 0,2% de THC ou “A” (amarela) para concentrações acima disso.
A força da Lei Pétala
Nada disso seria possível sem a Lei Estadual nº 21.364/2023, batizada de Lei Pétala, regulamentada pelos Decretos nº 4.977/2024 e nº 10.222/2025. A legislação, construída a partir da escuta ativa de famílias e profissionais da saúde, simboliza a transformação de uma antiga criminalização em política pública.
Inspirada na luta de pacientes como Pétala, uma menina diagnosticada com esclerose múltipla que teve sua qualidade de vida completamente transformada após o uso da cannabis medicinal, a lei facilita o acesso gratuito ao medicamento em casos específicos e urgentes — como o dela.
“Meu filho passou anos em convulsões diárias. A cada madrugada, eu me perguntava se ele resistiria até o amanhecer. Quando o CBD entrou na nossa vida, as crises diminuíram e, com elas, voltou o brilho nos olhos dele. Hoje eu sinto que ele vive, não apenas sobrevive”, conta Ana Paula, mãe de um paciente beneficiado.
Política que floresce
Com a regulamentação da oferta de medicamentos à base de maconha no SUS, o Paraná reafirma seu compromisso com uma saúde pública inclusiva, científica e humana. Ao reconhecer o direito ao tratamento digno e eficiente, o estado se torna referência nacional em uma área que, até pouco tempo, era cercada de preconceitos e desinformação.
Esse novo capítulo da saúde pública paranaense não é apenas uma vitória para quem precisa dos medicamentos hoje. É um legado para as próximas gerações, para que nenhuma criança, nenhum ser humano tenha que esperar o colapso de seu corpo para ter acesso a uma chance de viver com dignidade.
📌 Para mais informações sobre o processo de solicitação, acesse o site da Secretaria da Saúde do Paraná ou entre em contato com a farmácia regional do seu município.
Ronald Stresser | Jornalismo com alma | https://sulpost.blogspot.com
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