Paraná na Blindagem: dois em cada três deputados votam para enterrar investigações — Senado é a última chance
Por Ronald Stresser — Sulpost

Sessão da Câmara dos Deputados durante votação da PEC — Lula Marques/AB

Na contagem que muitos preferiam não ver, o resultado foi de silêncio e omissão: 67% da bancada federal do Paraná acabou por votar a favor da chamada PEC da Blindagem — a Proposta de Emenda à Constituição que cria novos obstáculos para que parlamentares sejam investigados e processados, mesmo em casos que, até ontem, correriam livremente nas instâncias da Justiça.
A aprovação na Câmara, em dois turnos na madrugada de terça para quarta (353 votos no 1º turno e 344 no 2º), entrou para a história como uma das decisões mais ásperas tomadas contra o sentimento público de prestação de contas. Para quem mora no Paraná, os números não são abstratos: significam deputados — rostos conhecidos, prefeitos que buscam apoio, líderes que batem às portas — que escolheram proteger a classe em vez de facilitar a investigação de possíveis crimes. 1
A proposta, que foi relatada pelo deputado Cláudio Cajado e tramitou como PEC 3/2021, retoma trechos de uma tradição de privilégios ao definir que, desde a expedição do diploma, membros do Congresso não poderão ser presos — salvo em flagrante de crime inafiançável — nem ser alvo de certas medidas sem prévia licença da respectiva Casa. Em linhas práticas, isso amplia o foro e abre caminho para que decisões sobre prisões e processos sejam, antes de tudo, políticas.
Quem votou como se nada tivesse mudado
Do lado do Paraná, a lista dos que apertaram o botão “sim” mistura nomes do centro-direita e da direita, alguns expoentes locais e até um voto surpreendente da esquerda. Entre os favoráveis estão Beto Richa (PSDB), Ricardo Barros (PP), Pedro Lupion (PP), Sargento Fahur (PSD) e outros que, nos corredores da política estadual, têm papéis decisivos nas articulações do dia a dia. Aliel Machado (PV) — sim, um voto vindo de um parlamentar identificado com pautas socioambientais — também figurou entre os a favor.
Em contrapartida, o PT-PR se colocou de forma mais nítida contra: entre vozes que apressam a lembrança da luta por transparência, nomes como Tadeu Veneri lamentaram o que chamaram de “retrocessos” na democracia. “Os coronéis da extrema-direita impuseram um retrocesso à democracia e à transparência”, disse Veneri, ecoando o sentimento de quem vê no texto um convite à impunidade.
Contradições e política por trás das cortinas
O episódio traz contradições que ardem: o ex-juiz e hoje senador Sergio Moro criticou a PEC em nota, mas todos os deputados de seu partido, o União Brasil, votaram a favor — um dado que expõe o fosso entre discurso público e jogo de bancada. Enquanto isso, a articulação para aprovar a PEC teve a assinatura visível da presidência da Câmara e de partidos como PL e segmentos do centrão. Para muitos especialistas ouvidos nas últimas horas, não se trata apenas de uma reforma técnica; é, sobretudo, um gesto simbólico — e perigoso — de quem busca blindar a política de responsabilização.
O que muda na vida das pessoas
Para a dona Maria, que sustenta a casa com bicos e viu cortar programas sociais nos últimos anos, a PEC parece distante — até que se entende o mecanismo: se prefeitos e deputados estiverem menos expostos a investigações, há menos incentivo à transparência na destinação de recursos. Para o jovem que luta por uma vaga e observa contratos públicos fechados a portas fechadas, a sensação é de uma institucionalização do “tudo por eles”. A democracia, diz uma professora de ciência política ouvida por este jornal, sofre quando mecanismos que permitem responsabilização se tornam mais frágeis.
Senado: a última trincheira — e a oportunidade de escutar o país
A PEC segue agora para o Senado, onde precisa do voto de 49 dos 81 senadores para avançar. É lá que se joga a derradeira chance de mostrar se o Congresso consegue, ao menos uma vez, alinhar o arco das responsabilidades com a expectativa da sociedade. A pressão nas redes, as manifestações nas ruas e as ligações de leitores ao nosso e-mail não são apenas barulho: são lembretes de que cada decisão será cobrada nas urnas.
Em termos práticos para o Paraná: os três senadores da Casa — que já se manifestaram contra a versão aprovada na Câmara — terão nas mãos o papel de freio que a democracia pede. Se votarem com a população, o texto pode ser derrotado; se cederem às pressões partidárias, o preço será a confiança pública. Não é exagero: em política, memória é voto, e memória tem pernas longas.
O que você pode fazer
Cobrança é cidadania. Ligue, escreva, pressione os senadores do seu estado, participe das mobilizações pacíficas. Guarde os nomes dos deputados que votaram pela blindagem — em 2026 e além, esses números serão lembrados nas urnas. A democracia não se protege sozinha; ela pede a resistência de quem acreditou, um dia, que representação e responsabilidade andam juntas.
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