sábado, 12 de outubro de 2024

Latifundiários na Amazônia ocultam crimes ambientais

Terras na Amazônia Legal têm cadastro alterado para burlar restrições ambientais, revela estudo


Áreas de pasto avançam sobre áreas de roça e de coleta de açaí a castanha. (Foto: Fernando Martinho/Repórter Brasil)


Um novo estudo da organização Center for Climate Crime Analysis (CCCA) revelou uma preocupante prática de proprietários de terras na Amazônia Legal: alterações no Cadastro Ambiental Rural (CAR) estão sendo usadas para apagar registros de infrações ambientais, como embargos do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e sobreposições com Terras Indígenas. As mudanças permitem que os proprietários contornem restrições para obtenção de financiamentos com recursos públicos, já que o Banco Central veda o crédito para propriedades embargadas ou localizadas em áreas protegidas.

Entre 2019 e 2024, foram mapeadas 14.223 propriedades em estados da Amazônia Legal que modificaram seus registros no CAR para suprimir áreas com restrições ambientais. Dentre elas, 9.621 excluíram áreas desmatadas, 4.358 removeram embargos, e 1.770 alteraram registros para apagar sobreposições com terras protegidas. Ao todo, ocorreram 15.750 alterações, com algumas propriedades realizando mais de uma modificação.

Essas mudanças resultaram na exclusão de 4,9 milhões de hectares de áreas que, anteriormente, constavam nos registros como territórios privados. O estudo aponta ainda a existência de cadastros que, após as alterações, indicam propriedades situadas dentro de rios (463 casos). Essas alterações não apenas facilitam o acesso a crédito, mas também permitem a venda de produtos provenientes dessas áreas, contornando a fiscalização de crimes ambientais. Segundo o estudo, essa prática avança como um problema sistêmico que impacta o monitoramento ambiental e mina os esforços de combate ao desmatamento.

Impacto no controle ambiental

A manipulação do CAR afeta diretamente os órgãos de controle ambiental, já que muitas instituições utilizam os dados do cadastro para verificar irregularidades. Segundo o CCCA, a rede de manipulações compromete a eficácia das iniciativas que visam proteger a Amazônia e impedir o avanço do desmatamento.

Para mapear as alterações, o CCCA cruzou dados do CAR de 2019 a 2024 com dados de desmatamento do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), embargos aplicados pelo Ibama e informações sobre áreas protegidas. O CAR, criado em 2012 pelo Código Florestal, é um registro obrigatório para todas as propriedades rurais, mas permite que os proprietários façam alterações online, sem necessidade de justificativa.

Em 2023, o Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (Sicar) registrava mais de 7 milhões de propriedades cadastradas em todo o Brasil, sendo mais de 1 milhão na Amazônia Legal. O estado do Pará lidera o número de alterações relacionadas a desmatamento, seguido de Rondônia, Mato Grosso e Acre.

Resposta das autoridades

A Repórter Brasil, portal de notícias referência dessa postagem, afirma ter questionado as secretarias de meio ambiente dos estados do Pará, Rondônia, Mato Grosso e Acre sobre o monitoramento dessas alterações. O Pará informou que já cancelou 2.374 cadastros e suspendeu outros 3.654 em terras indígenas. Já o Mato Grosso afirmou que as alterações são auditadas, mas não detalhou quantas mudanças foram identificadas. As secretarias de Rondônia e Acre não responderam até o fechamento desta matéria.

Para Heron Martins, do CCCA, é essencial que o sistema de registros do CAR seja aprimorado, criando mecanismos que exijam justificativa e documentação das alterações. "Precisamos priorizar a análise dos casos já identificados e cancelar registros que claramente são ilegítimos", alertou.

O estudo reforça que as mudanças no CAR crescem ano a ano, com um aumento expressivo nas alterações motivadas por desmatamento entre 2019 e 2024. Para Martins, a solução envolve uma cooperação entre os estados e o governo federal, que é responsável pela gestão do sistema. No entanto, até o momento, o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima não respondeu aos questionamentos da reportagem sobre o monitoramento e funcionamento do sistema digital de cadastro.

O espaço permanece aberto para manifestações futuras das autoridades.

Ronald Stresser, com informações do Repórter Brasil.

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