quarta-feira, 25 de junho de 2025

Ilha da Trindade: farol de energia limpa

Luz no fim do oceano: a aliança entre Itaipu e Marinha que transforma a Ilha da Trindade em um farol de energia limpa

Por Ronald Stresser | Sulpost

 
Ilha da Trindade, no extremo leste da Amazônia Azul - Agência Marinha de Notícias
 

A Ilha da Trindade não aparece nos mapas turísticos. Ela não tem praias com quiosques nem voos diretos. Mas quem chega ali, após cinco dias de navegação em mar aberto, entende por que esse pedaço de terra vulcânica — a mais remota do Brasil — guarda um valor que vai além do visível. Trindade é um símbolo silencioso da presença brasileira no Atlântico Sul. E agora, graças a uma parceria entre a Itaipu Binacional, o Itaipu Parquetec e a Marinha do Brasil, ela começa a brilhar também como um marco de inovação energética e soberania ambiental.

Longe do continente, a 1.200 km da costa do Espírito Santo, Trindade parece resistir ao tempo — mas não aos desafios. Até pouco tempo atrás, toda a energia necessária para manter o Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade (POIT), a estação científica, os alojamentos e os equipamentos vinha de geradores a diesel que, ano após ano, consumiam mais de 60 mil litros de combustível fóssil. Para um lugar de pesquisa e preservação ambiental, esse paradoxo pesava mais do que os barris transportados em cada missão.

Mas agora, isso começa a mudar.

Virada energética em meio ao oceano

O projeto de transição energética, idealizado e implementado por Itaipu Binacional e Itaipu Parquetec em parceria com a Marinha do Brasil, busca exatamente o que parece impossível: garantir autonomia energética, limpa e segura a uma ilha sem porto, sem conexão com o Sistema Interligado Nacional e sem espaço para erros.

A solução? Um sistema híbrido que integra energia solar fotovoltaica, baterias de armazenamento e um sistema inteligente de gestão remota, operado diretamente de Foz do Iguaçu, no Paraná.

A montagem da usina fotovoltaica, com 480 painéis solares, exigiu uma logística desafiadora: todo o material — cerca de 50 toneladas — foi embarcado no NDM Almirante Saboia, navio da Marinha com 140 metros de comprimento, e depois transferido por helicópteros e botes, já que a ilha não possui estrutura portuária. Foram dias de operação minuciosa sob o calor equatorial e o mar revolto.

Tecnologia de ponta para ambientes extremos

Nos bastidores da inovação, está o trabalho de dois anos e meio de pesquisas, testes e desenvolvimento realizado nos laboratórios do Itaipu Parquetec, o braço tecnológico da hidrelétrica de Itaipu. O objetivo não era apenas gerar energia — era gerar confiança. O sistema implantado na Ilha da Trindade é capaz de monitorar em tempo real dados como temperatura, consumo por setor e o estado das baterias, reduzindo desperdícios e otimizando o uso dos recursos naturais disponíveis.

Segundo os engenheiros do projeto, o modelo é capaz de funcionar de maneira totalmente automatizada. Quando o sol brilha, a energia vai diretamente para a operação ou para as baterias. Em períodos de baixa insolação, os sistemas de armazenamento entram em ação, mantendo a estabilidade da rede local. E, se necessário, ainda existe um gerador a diesel de emergência — agora, usado apenas como último recurso.

A ciência e a soberania agradecem

Mais do que resolver um problema energético, o projeto representa um reforço à presença brasileira em uma região estratégica, rica em biodiversidade, com potencial mineral submerso e importância geopolítica crescente. A Cadeia Vitória-Trindade, que se estende até a ilha, é uma área de interesse científico e ambiental, e manter uma estrutura permanente ali é fundamental para assegurar a soberania nacional.

A estação científica da Marinha, junto ao POIT, realiza estudos sobre correntes oceânicas, mudanças climáticas, biodiversidade e até bioprospecção — a busca por substâncias marinhas com potencial para tratamento de doenças como câncer, malária e doença de Chagas. Cada watt de energia limpa gerado ali fortalece também essas descobertas.

Modelo para transformar realidades

A experiência adquirida em Trindade não termina no horizonte do arquipélago. O modelo energético implantado ali é replicável. Em um país com centenas de comunidades isoladas da Amazônia ao Sertão, fora do alcance do sistema elétrico nacional, a iniciativa abre um novo caminho: levar energia sustentável para onde ela nunca chegou.

Se funcionar — e tudo indica que sim —, o projeto será mais do que uma revolução insular. Será uma lição continental.

Quando o futuro amanhece primeiro

A Ilha da Trindade é o primeiro pedaço de Brasil a ver o sol nascer todos os dias. É também, agora, o primeiro a mostrar que, com vontade política, tecnologia nacional e respeito ao meio ambiente, é possível iluminar o amanhã com a força do presente.

Ao trocar o rugido dos geradores pelo silêncio das placas solares, Trindade nos lembra que o progresso não precisa ser barulhento — ele só precisa ser sustentável.

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