Não vemos nós na tragédia os entes mais nobres, após longos combates e prolongados sofrimentos, renunciarem para sempre aos desígnios que até ali perseguiam com violência, ou desviarem-se de todos os gozos da vida voluntariamente e com prazer:
como o príncipe de Calderon; Gretchen no Fausto, Hamlet a quem o fiel Horácio seguiria da melhor vontade, mas que lhe promete ficar e viver ainda algum tempo num mundo tão cruel, tão cheio de dores, para contar o destino de Hamlet e purificar-lhe a memória; assim também Joana d'Arc, e a noiva de Messine: todos morrem purificados pelos sofrimentos, isto é, depois de se extinguir neles a vontade de viver...
O verdadeiro sentido da tragédia é essa observação profunda, que as faltas expiadas pelo herói não são as deles, mas as faltas hereditárias, isto é, o próprio crime de existir:
Pois, o delito maior
É o de o homem ter nascido."
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Fonte: Arthur Schopenhauer, in "As Dores do Mundo" - Imagem: Obra de arte por Frances Ruth (reprodução)
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